Sem sombra de dúvidas “cuidar” do outro é uma arte, principalmente durante a quarentena. Relacionamentos são desfeitos, amizades antes consideradas sólidas são colocadas em xeque e, algumas vezes, nos vemos diante de um abismo.
Desde a minha separação, que já emplaca a marca de seis anos, venho todos os dias me fortalecendo para a busca de alguém que realmente aja com reciprocidade e parceria. Essas qualidades que vos falo e que deveriam ser inerentes da nossa espécie parecem em extinção.
Algumas vezes a solidão pode ser encarada como uma maneira de pararmos, acendermos nossas luzes internas, analisarmos o que pretendemos e depois seguir em frente.
A sociedade atual caracteriza-se pelo imediatismo, pelo egoísmo espiritual e pela arte da indiferença com os próximos. O nosso valor natural é sombreado pela lógica da acumulação das aparências e do interesse. Embora não tenha predileção por partidos políticos torço, do fundo do meu coração, que as coisas melhorem na atual gestão de nosso presidente. Obviamente, não tenho orgulho de suas atitudes, embora torça para que tudo dê certo. Devemos pensar em coletividade, em divisão, em solidariedade e em compaixão.
O oposto da falta de zelo e descaso é a palavra “cuidar”. A nossa vida é feita de reveses e paradoxos e, para a busca da felicidade temos que passar por turbulências, de preferência unidos espiritualmente. Creio que uma de minhas virtudes é sempre aprender com a fala de meus alunos; seria ínfima minha participação somente como um mero “informador” didático – os livros e artigos científicos fazem melhor. O mais importante nesse contexto é ensinar e aprender.
Mais do que nunca, é tempo de fazermos algo para os outros de alguma maneira, mesmo que não dê certo. Sejamos capazes de decidir, a partir das nossas leituras e interpretações, como será a nossa evolução na Terra. Encontremos conectados com nossas crenças, soluções criativas à medida que os obstáculos aparecem.
Lembro-me de ser criticado por familiares por não ter levado minha mãe as sessões de quimioterapia durante seu processo de adoecimento. Chorei algumas vezes, várias vezes, muitas vezes. Achava que, como médico, teria o dever de fazer isso. Hoje já sou capaz de perceber o quanto amei, cuidei, chorei, sofri, passei noites em claro e, principalmente, tornei-me um paciente oculto durante esse processo. Acompanhei-a em dois processos cirúrgicos para possível retirada de parte do tumor. Os olhos ainda enviam mensagens internas para meu cérebro de sua “laparotomia” sem sucesso. Sofri durante anos com críticas e deturpações de pessoas que literalmente sumiram, mas me deixaram um presente, a minha avó.
Relembro o dia em que segurei mão de minha mãe e falei: “descanse, fique bem, estou aqui, te amo”. Seus dentes já estavam sem brilho e seu corpo descolorindo. Cerca de quinze minutos depois recebi a ligação do hospital que ela tinha partindo para um lugar muito melhor. Sentei em uma padaria com um grande amigo e professor Marco Antônio Araújo Leite, que me afagou com palavras – um ser muito generoso.
Para algumas pessoas ela faleceu, mas para quem é filho isso não funciona assim. Sinceramente qual o meu sentimento por quem me julgou ou me julgará? Nenhum. Espero que busquem suas verdades internas, sejam felizes e, principalmente parem de atirar flechas e julgar os seres humanos. Existe muita gente com fome, com sede, com frio e com vontade de viver dignamente.
Gostaria que essa crônica seja lançada como uma gaivota de papel e pouse na consciência de cada brasileiro. Sempre as dedico para João e Bento Orsini; filhos que me completam.