“Orem continuamente”
(1Ts 5:17)
“Tá” difícil para caramba, não “tá”? A vida não está facilitando para ninguém. Como fazer então para não desesperar? Como fazer para não adoecer, enlouquecer, sucumbir, quebrar? Eis a sugestão do apóstolo Paulo: “Orem continuamente”. Porque a oração é o meio através do qual nós seguramos nas mãos de Deus! Orar é segurar nas mãos de Deus. Daí que seja importante orar sempre, mas especialmente quando a vida anda difícil, quando sentimos o fardo mais pesado do que podemos suportar, quando a esperança vai pouco-a-pouco definhando dentro da gente. Nestas horas, não dá para negligenciarmos a oração!
Todas as pessoas que estudam o fenômeno religioso estão de acordo sobre o seguinte: a oração é a forma mais fundamental de relação com o divino que existe! Se há algo que caracteriza uma pessoa como religiosa – ou como espiritual (para usar uma palavra menos carregada) –, é o fato de a pessoa se orientar para além de si mesma por meio da prece, da súplica, da oração. Quem sabe que há algo que ultrapassa a si mesmo, que há uma transcendência, e de alguma maneira a ela se refere e a partir dela se autocompreende e se orienta no mundo, é uma pessoa espiritual, religiosa no sentido mais próprio da palavra (a rigor, uma pessoa religiosa não é necessariamente alguém que aderiu formalmente a uma comunidade ou tradição de fé; religioso é quem tem o “sentimento religioso”, quem faz a experiência da transcendência).
No encontro com Jesus, os discípulos fizeram esta experiência, por isso passaram a seguí-lo como mestre e lhe pediram que os ensinasse a orar: “Senhor, ensina-nos a orar, como João ensinou aos discípulos dele” (Lc 11:1). É que a maneira como oramos fala muito sobre quem somos. Pela maneira como uma pessoa ora é possível saber como ela concebe esta transcendência e que implicações isto tem em sua vida. Em outras palavras: a oração revela em quê ou quem uma pessoa crê e que valores norteiam sua vida.
Jesus era um homem de oração. E sendo quem era, sentia a necessidade de orar – e efetivamente orava (não ficava apenas na consciência culposa ou preguiçosa a respeito). Diversas vezes os Evangelhos registram que Jesus se retirou para orar. E não somente ele. No NT, nós vemos Pedro orando, vemos João, Maria, Paulo, as diferentes comunidades cristãs… No AT, vemos Moisés, Ana, Davi, os profetas. Todos oravam. Ao contrário do que comumente se pensa, a oração é sentida como mais necessária justamente pelas pessoas cujas espiritualidades são mais desenvolvidas. É contraintuitivo, mas não é que a pessoa mais amadurecida espiritualmente precise menos se apoiar em Deus por meio da oração, é justamente o contrário: quanto mais amadurecida espiritualmente, mais a pessoa sente precisar da oração. Porque a ela é a espinha dorsal da vida espiritual. Ela não é apenas uma parte constitutiva, mas a parte constituinte por excelência da vida espiritual. É a oração que estabelece a relação de base, o alicerce, o terreno sobre a qual a vida espiritual se edifica. Daí Paulo dizer: “Orem continuamente”.
Jesus orava sempre e nas horas de cansaço e/ou dificuldade intensificava suas orações. Pois orar trazia descanso e lucidez para sua alma, além reenergizar o seu corpo. Isto explica o espanto de Jesus com a sonolência dos discípulos na hora mais aguda de sua vida: “Nem por uma hora vocês puderam vigiar comigo?” (Mt 26,40). Provavelmente ele também se espantaria com nossa displicência com a oração, sobretudo neste tempo tão crítico em que estamos vivendo e do qual tão frequentemente nos queixamos. Em épocas assim, orar é vitalmente importante. Mais importante que comer até. Porque pão somente não dá conta de nos sustentar num mundo que se nos tornou hostil.
O profeta Daniel entendia isto. De fato, quando foi levado como escravo para a Babilônia para servir no palácio de Nabucodonozor, Daniel se recusou a comer das finas iguarias da mesa do rei, mas não interrompeu as suas orações. Muito pelo contrário: como um atleta disciplinado que sabe a importância de treinar, três vezes por dia ele orava. Afinal, uma pessoa espiritual/religiosa que não ora é como um atleta que não treina. O que se pode esperar de um e outro? Como num jogo, a vida é dura e imprevisível. E é preciso estar preparado para as adversidades, para o inesperado. E a oração nos prepara para isto. Com efeito, a oração nos prepara e capacita para enfrentar as tempestades que tantas vezes nos pegam de surpresa. Porque é sabido: ora os ventos sopram a nosso favor, ora estão contra nós – é que a vida não toca como uma playlist do Spotify, ela não tem qualquer compromisso com nossos planos ou nossa vontade. Não estamos no controle de nada! Nossos planos tão bem elaborados não são garantia de coisa alguma. Sem a boa mão de Deus para nos amparar, podemos facilmente sucumbir! A oração, todavia, entrelaça a mão de Deus e as nossas.
Por isso Paulo é tão incisivo: “Orem continuamente”. Orem, orem, orem. Não porque Deus está no controle – essa sequer é uma afirmação bíblica –, mas porque Deus está conosco! Porque Deus é por nós. Porque Deus vem ao nosso encontro em meio as tempestades, andando por sobre as águas. Esta sim é uma promessa a qual podemos nos agarrar. E nos agarramos a ela por meio da oração! Quando estava afundando sob as ondas, apavorado com o vento que soprava forte, Pedro clamou: “Salva-me, Senhor”! O texto diz que “Imediatamente Jesus estendeu a mão e o segurou” (Mt 14:31). Oração não é mágica, não tem superpoderes, não acalma por si só a tempestade, mas nos mantém ligados a Deus. Ela é nosso vínculo com o Eterno, a nossa conexão com céu. E isto é o que nos sustenta (ao lado do pão de cada dia).
Nós precisamos orar. Precisamos orar sempre. Sobretudo em dias difíceis como os atuais. Oremos então. Deus ouve as nossas orações. E segura nas nossas mãos.