73% dos moradores da capital aprovaram a intervenção federal, mas 54% consideraram que iniciativa não teve impacto no combate à violência
Os milicianos são hoje mais temidos que os traficantes de facções criminosas dentro das comunidades e entre os moradores da zona sul do Rio de Janeiro. Segundo pesquisa do Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), 29% dos entrevistados nas comunidades têm mais medo das milícias do que de traficantes e policiais – 25% têm mais medo do tráfico, 18% da polícia e 21% de todos na mesma proporção. Na zona sul, onde se concentram os bairros mais ricos da cidade, esse índice é ainda maior: 38% temem mais as milícias contra 20% dos traficantes, 24% de todos, e 12% da polícia.
A pesquisa foi elaborada para avaliar o impacto da intervenção federal e ouviu 843 pessoas na capital fluminense entre os dias 23 e 25 de janeiro deste ano, quando as tropas já haviam deixado o estado. Para 73% das pessoas entrevistadas, a intervenção nas forças de segurança foi aprovada, embora 54% considerem que a iniciativa não surtiu efeito no combate à violência. Apenas 20% foram contra a intervenção, e 39% disseram que a presença dos militares nas ruas da cidade teve efeito positivo no enfrentamento ao crime.
“Os números mostram um aspecto pouco debatido no que diz respeito à intervenção que é a dimensão do medo. As pessoas continuam apavoradas. Também chama a atenção o dado de que, para uma parcela significativa dos cariocas, a polícia representa um risco maior que o traficante ou o miliciano. As forças policiais, que devem ser valorizadas e protegerem a população, não têm a confiança de muitos moradores do Rio”, analisou Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Se forem levados em consideração os dados colhidos em toda a cidade, o medo dos traficantes de facções ainda supera o das milícias, com 34% e 27%, respectivamente. Outros 12% tem mais medo de policiais e 22% tem medo de todos na mesma proporção. Entre as pessoas que declaram ter mais medo dos traficantes, 39% são favoráveis à intervenção federal na cidade, 17% foram contra e 16%, indiferentes. No caso de quem teme as milícias, foram 27% a favor, 30% contra e 18% mostraram-se indiferentes.
Medo de morrer assassinado
Outros dados da pesquisa chamam bastante atenção, como o medo de os cariocas morrerem assassinados, que está presente em 87% dos entrevistados, sendo que 77% dessas pessoas revelou ter “muito medo” de que isso ocorra em algum momento. Já 92% temem ser vítima ou ter um parente atingidos por bala perdida; 91% de ser assaltado em casa, no trabalho/escola ou no transporte coletivo; 92% de ser ferido ou morto em um assalto ou roubo; 85% de ter o celular roubado; e 79% temem ter dados pessoais expostos na internet ou serem acusados de um crime.
O levantamento também questionou se os entrevistados foram de fato vítimas de algum tipo de violência nos últimos 12 meses. Os dados mostram um contraste entre o medo e a realidade dos cariocas. Nesse caso, 75% dos entrevistados disseram ter ouvido barulho de tiros no período, enquanto 29% se viram no meio de fogo cruzado entre policiais e bandidos – 5% declararam terem sido vítimas ou terem um parente atingidos por balas perdidas; 15% foram assaltados ou roubados em casa, no transporte ou no trabalho/escola; 17% tiveram algum objeto de valor tomado à força em um assalto ou furto; e 20% perderam o celular em um assalto ou roubo.
Medo da violência é estável
A pesquisa é a segunda do gênero realizada a pedido do FBSP para monitorar os resultados da intervenção federal no Rio de Janeiro, que terminou em dezembro do ano. Os dados de 2019 diferem pouco dos coletados em 2018, logo após o início da intervenção federal. Na pesquisa realizada em março do ano passado, 76% das pessoas ouvidas eram favoráveis à intervenção e 71% não viam diferença no combate à violência com o uso das forças militares. No caso das pessoas que temem ser vítimas ou mesmo ter um parente atingido por uma bala perdida, o índice foi exatamente o mesmo registrado no levantamento do ano passado e agora: 92%.
Os levantamentos realizados em março do ano passado e em janeiro deste ano tratam-se de uma iniciativa que se soma ao monitoramento realizado durante o período da intervenção pelo Observatório da Intervenção, do Cesec/Ucam. A margem de erro é de 3,0 pontos para mais ou para menos, considerando um nível de confiança de 95%. Isto significa que se fossem realizados 100 levantamentos com a mesma metodologia, em 95 os resultados estariam dentro da margem de erro prevista.